O mar (de Vigo), que leva e traz de volta o amado, o amigo, é o que dá vida e movimento a Sem Mim. O balé é embalado pela trilha original urdida a quatro mãos pelo viguês Carlos Núñez e pelo brasileiro José Miguel Wisnik a partir do único conjunto de peças do cancioneiro profano medieval galego-português que chegou aos nossos dias com as respectivas partituras de época: o célebre “ciclo do mar de Vigo”, de Martín Codax. Nas sete canções, datadas do século XIII, o poeta se pronuncia sempre em nome da mulher; mais especificamente de jovens apaixonadas que pranteiam a ausência ou festejam a iminência do regresso do amado-amigo. Na avidez do reencontro, elas confidenciam ora com o mar, ora com a mãe, ora com amigas. E, para aplacar ou fustigar o seu desejo, saem a banhar-se nas ondas do mar de Vigo.
SÉRIE REPERTÓRIO GRUPO CORPO – DOCUMENTÁRIO ONQOTÔ
Direção: Cláudia Ribeiro e Janaína Patrocínio
Duração: 52 minutos
Ano: 2015
Produção: Grupo Corpo e JPZ Comunicação
A perplexidade e a inexorável pequeneza do homem diante da vastidão do universo é o tema central de “Onqotô”, balé que, em 2005, marcou as comemorações dos 30 anos do Grupo Corpo. Assinada por Caetano Veloso e José Miguel Wisnik, a trilha sonora tem como ponto de partida uma bem-humorada discussão sobre a paternidade do universo.
Este documentário mostra o processo de criação dessa obra comemorativa, permitindo um acesso privilegiado aos bastidores do Grupo Corpo.
SÉRIE REPERTÓRIO GRUPO CORPO – DOCUMENTÁRIO LECUONA
Direção: Cláudia Ribeiro e Janaína Patrocínio
Duração: 53 minutos
Ano: 2015
Produção: Grupo Corpo e JPZ Comunicação
Nessa obra, o Grupo Corpo rende-se à genialidade do maior ícone da música cubana, o pianista Ernesto Lecuona, e decide abrir uma exceção à regra, estabelecida em 1992, de só trabalhar com trilhas exclusivas, para colocar em cena o balé que leva o seu nome: “Lecuona”. Os casais se sucedem decantando paixões, segundo roteiros que vêm tanto do romantismo mais desbragado quanto do realismo sem máscara de cada um de nós.
Este documentário mostra o balé na íntegra, intercalado por cenas de bastidores, depoimentos e curiosidades gravadas ao longo do processo de criação.
Sobre uma trilha original do compositor pernambucano Lenine, operada apenas por instrumentos de corda, o Grupo Corpo explora a tensão inerente ao processo criativo onde, muitas vezes, tudo parece “estar por um triz”.
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Vestidos de branco do princípio ao fim do balé, movimentando-se sobre o linóleo também branco e tendo ao fundo um painel que pouco a pouco revela saliências e reentrâncias de uma estrutura que sugere uma gigantesca geleira, os bailarinos do Grupo Corpo percorrem o instigante emaranhado de temas composto por Samuel Rosa para a trilha de Suíte Branca.
Idealizado como as antigas tabulas rasas romanas ou uma página em branco, sobre a qual uma nova história começa a ser inscrita, Suíte Branca marca a primeira colaboração da jovem coreógrafa paulista Cassi Abranches com a companhia mineira de dança. Entre ondulações de braço e quadril, movimentos pendulares, suspensões e muitas intercorrências de chão, a partitura de movimentos erguida por ela propõe um diálogo com a lei da gravidade, onde é possível entrever os traços distintivos do Corpo que há tanto tempo habitam o nosso imaginário e, ao mesmo tempo, divisar a força de uma inequívoca alteridade.
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Escrever na língua nativa a palavra balé (assim, com um ele só e acento agudo) tem sido a busca consciente e obstinada de Rodrigo Pederneiras desde o antológico 21, de 1992. A inspiração sertaneja e a transpiração pra lá de contemporânea da trilha composta por Tom Zé e José Miguel Wisnik para Parabelo, de 1997, permitiram ao coreógrafo do Grupo Corpo dar vida àquela que ele mesmo define como a “a mais brasileira e regional” de suas criações. De cantos de trabalho e devoção, da memória cadenciada do baião e de um exuberante e onipresente emaranhado de pontos e contrapontos rítmicos, emerge uma escritura coreográfica que esbanja jogo de cintura e marcação de pé, numa arrebatadora afirmação da maturidade e da força expressiva da gramática construída ao longo de anos pelo arquiteto de Missa do Orfanato e Sete ou Oito Peças para um Ballet.
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Tematizando o imaginário urbano, a coreografia de Rodrigo Pederneiras dialoga inovadoramente com a trilha eletrônica de Arnaldo Antunes. No ritmo acelerado dos movimentos, na violência dos gestos, nas quebras das linhas e no arqueamento dos corpos que buscam se mover rente ao chão, Rodrigo Pederneiras desenvolve novas características para essa dança, que vai da malemolência ao robótico. “O corpo é suficientemente opaco / para que se possa vê-lo.” Esse corpo dança banhado na luz-cenário de Paulo Pederneiras, um quadrado de spots vibrando com a música como um gigantesco analisador de espectro. O Corpo transforma o cenário em luz e os figurinos em cenários móveis: são esculturas pretas que dançam numa caixa vermelha. Os corpos ganham novos volumes pelo desenho das roupas de Freusa Zechmeister e Fernando Velloso. Formam uma gangue, ou tribo; mas suas individualidades são acentuadas pelo movimento e pelo inusitado dos figurinos.
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Homenagem, em música e movimento, ao mais erudito dos compositores populares brasileiros, Ernesto Nazareth (1863-1934), o balé Nazareth, de 1993, transporta para o palco, com insuspeitado requinte, a sensualidade e a brejeirice da dança brasileira de salão. Com base na obra do genial criador do “tango brasileiro”, o compositor e escritor paulista José Miguel Wisnik recorre ao conceito de espelhamento melódico para operar movimentos retrógrados que, induzidos por computador, desvendam surpreendentes e cristalinas construções musicais, numa recriação absolutamente autoral, original e contemporânea da obra de Nazareth. São comentários, citações, variações, que, bebendo sempre da mesma fonte, terminam por desaguar em outros braços de mar. O erudito e o popular se encontram e se confundem também na transcriação cinética e visual do gênio de Ernesto Nazareth (1863-1934) pela equipe de criadores do Grupo Corpo.
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Criada a partir da missa solene composta e regida por ocasião da consagração da Igreja do Orfanato, na Viena de 1768, por um Mozart que não contava ainda os treze anos completos, a Missa do Orfanato, de 1989, inscreve-se entre as obras máximas do Grupo Corpo. Estabelecendo já os primeiros códigos de uma escritura coreográfica que iria atingir sua maturidade três anos depois com 21, um divisor de águas na trajetória da companhia, Rodrigo Pederneiras transforma seu corpo de baile em uma massa de desvalidos que, na contramão do que prega o ordinário da missa católica, retrata antes a tragédia e a miséria da condição humana que o anseio de glorificação do Divino. Em estado de contrição permanente, os corpos dos bailarinos ritualizam o desamparo, o temor, o afligimento e a solidão inerentes à natureza inapelavelmente terrena e transitória da espécie humana. Na busca incessante de verticalidade, seus gestos convulsos soam como brados de misericórdia.
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Amores ardentes, vorazes volúpias, ciúmes nefastos, corações partidos, saudades brutais, desprezo, rancor, indiferença… Com letras que beiram o kitsch e a construções melódicas estonteantemente belas, o romantismo rasgado das canções de Ernesto Lecuona (1895-1963) havia capturado o coração bailarino do coreógrafo Rodrigo Pederneiras em meados dos anos 80. Duas décadas depois, em 2004, o Grupo Corpo rendia-se à genialidade do maior ícone da música cubana de todos os tempos e decidia abrir uma exceção à regra, estabelecida em 1992, de só trabalhar com trilhas especialmente compostas para colocar em cena o balé que leva seu nome: Lecuona. Uma vertiginosa sequência de 38 minutos de pas-de-deux e uma única formação de grupo, criadas por Rodrigo Pederneiras sobre doze doridas canções de amor e uma valsa do célebre autor de Siboney, emprestam a Lecuona um caráter absolutamente singular e diferenciado das demais criações do grupo.
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O princípio de interdependência e complementaridade que rege as relações humanas serviu de ponto de partida para a criação de Ímã pelo coreógrafo Rodrigo Pederneiras. Suave e vital, trivial e estranho, o balé do Grupo Corpo é marcado pela alternância constante entre o cheio e o vazio na ocupação do espaço cênico. Solos, duos e formações maiores ou menores de grupo se constituem e se dissipam a todo momento, num jogo incessante de união e dispersão. A trilha composta pelo + 2, trio formado por Domenico, Kassin e Moreno, sobrepõe timbres e texturas de instrumentos de origens e naturezas diversas – como a guitarra e a ocarina, ou o sinth e a cuíca – para trafegar por temas abstratos, essencialmente melódicos ou tipicamente eletrônicos, e revelar influências que vão do bossanovista João Donato, ao ícone da música afro dos anos 70 Fela Kuti, passando pelo multi-instrumentista contemporâneo japonês Cornelius.
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Os ritos da umbanda – a mais cultuada das religiões nascidas no Brasil, resultado da fusão do candomblé com o catolicismo e o kardecismo – são a grande fonte de inspiração da estética cênica de Gira. Exu, o mais humano dos orixás – sem o qual, nas religiões de matriz africana, o culto simplesmente não funciona – é o motivo poético que guia os onze temas musicais criados pelo Metá Metá para Gira. Mergulhar no universo das religiões afro-brasileiras para se alinhar ao tema proposto pelo Metá Metá foram as primeiras providências dos criadores do Grupo Corpo. Mas engana-se quem pensa que vai assistir a uma representação mimética dos cultos afro-brasileiros. Alimentado pela experiência em ritos de celebração tanto do candomblé quanto da umbanda (em especial as giras de Exu), Rodrigo Pederneiras (re)constrói o poderoso glossário de gestos e movimentos a que teve acesso.
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